quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

100 lovers ago...

há um tempo atrás (não muito tempo), nós costumávamos nos sentar sob aquela árvore. você enrolou o cachecol em volta da boca, e disse que se parecia com um desses gângsters de filmes noir dos anos 40, só que com um aspecto menos ameaçador. no verão, escrevemos um "s", com um estilete, no canto esquerdo de um dos galhos maiores. não sabíamos quais flores cairiam, ou quantas folhas seriam necessárias para cobrir todo o chão do parque, igual a um tapete mágico e vivo. "merci pour le poison", você diria naquela tarde no restaurante, no que corrigi: "poisson" é peixe, "poison" é veneno, como no inglês. na sua cama, amassei os lençois com a ponta dos dedos. fingi serem os seus cabelos: ora bem compridos, ora raspados, pontiagudos. uma teia de aranha veio parar dentro de um sapato: assoprei-a com força, como havia feito em um dente-de-leão, que você desenhara se desfazendo. "é possível tudo terminar antes mesmo de começar?" e eu não respondi, hesitei, caminhei um pouco e tirei um retrato seu debaixo daquela mesma árvore. as folhas já acarpetavam quase tudo, e eu pensava: "não vai sobrar espaço nenhum para ele em minha vida". e assoprei, e apertei o botão para disparar o obturador da máquina, e dobrei o lençol. mas não podia mais sentir seus cabelos entre meus dedos, já cansados.

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um zero e dois pensamentos © 2013.
textos autorais de Felipe Fernandes. design: Diogo Machado.

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